quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Meus demônios

                 Era uma manhã gélida e cinza. Acordara às seis da manhã, tem trabalho às sete. Não queria acordar, tão bom o sonho que estava tendo... Ao tocar do despertador, não lembrava mais de nada desse sonho, só sabia que era bom e que era algo que envolvia seus amantes e alguém lhe enviando bilhetinhos declarando seu amor. Na vida real não era assim, nunca foi. Ninguém nunca lhe enviara bilhetinhos de amor, e também nunca tivera amante algum. Pelo menos não de verdade, não bom, desses que duram tempo, que não é nada sério, mas que você gosta, e liga, e sabe, e tem e vai. Não. Tudo que sempre teve foram anos e anos de solidão. Solidão esta querida, solidão esta buscada, mantida e principalmente confortável. Nunca gostou de ser tão só, mas era mais fácil.
                 De repente, uma parte do sonho, uma "cena", passa por sua mente. Como um automóvel a mil por hora que passa e não deixa rastro. Sentiu de novo aquela coisa estranha. Aquilo a deixava ansiosa, aflita, desconfortável, insegura, louca. Era quase uma cólera, um tanto mais leve. Sentia isso toda vez que pensava nele. Mas como? Não havia pensado nele! Bem... pelo menos não até aquele momento.
                  Ao chegar no trabalho, tudo igual: Bom-dia!/ Licença/ Bom-dia!/ Essa-não/ Oh-Deus-mais-um-dia/ Bom-dia!/ Aqui-vamos-nós/ Pois-sim/ Pois-não/ Orr. E aquele mesmo vazio, aquela mesma expressão apática, aquela sensação de falta. Falta de alma, de vida. E aquela coisa estranha não se ia... Mas como? estava trabalhando, não estava pensando nele... Droga, não até aquele momento. E isso se prolongou até a hora do almoço, quando saía naquele sol-infernal-de-uma-da-tarde e caminhava até a praça Solitaire (um tanto irônico, mas perfeitamente assim). Tantas sombras que nunca lá, tantos sopros de vento, tanto vazio, tanto ninguém ali, tanto não ela ali... - São meus demônios - ela pensou. E sentou-se num banco à sombra, abriu seu livro de Caio, seu tão amado Caio, e pois-se à ler. Dama da noite, eles a chamavam assim, e nem sabem que dorme o dia todo... Até que uma ventania forte se ergue. Ouviu seu nome ser chamado, ouviu perfeitamente. Olhou para os lados, mas não viu ninguém. Olhou para cima, e as nuvens cobriam os sol-infernal-de-uma-da-tarde. Tudo nublado e cinza, como aquilo alojado em seu peito. Assim perfeito. Não mais só, chamaram seu nome. Assim perfeito. - São meus demônios - ela pensou, e sorriu.

                                                                  Kuroneko-Chan
                                                                      23.09.11

2 comentários:

  1. Dominar os demônios interiores pode parecer mais fácil em teoria, na prática já são outros quinhentos, venho acompanhando seus textos a um tempo mais nunca havia comentado, hoje senti a necessidade de faze-lo. Continue com o bom trabalho e até breve \o

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